THAÍS NICOLETI DE CAMARGO
CONSULTORA DE LÍNGUA PORTUGUESA
Durante muito tempo, as aulas de gramática no ensino médio focaram o estudo da classificação das palavras e das funções sintáticas das expressões, por vezes privilegiando a chamada nomenclatura gramatical.
Isso provocou em muitos estudantes certa aversão pelas aulas de português, em geral muito abstratas.Não raro, os professores faziam malabarismos para adequar as manifestações da língua, organismo em permanente estado de mutação, a um modelo descritivo fixo, que nem sempre conseguia explicar a contento os fenômenos linguísticos.
O artifício, então, era trabalhar com frases passíveis desse tipo de análise.Já há algum tempo, porém, os principais vestibulares do país, como o da USP e o da Unicamp, entre outros, deixaram de cobrar dos candidatos questões cuja resposta requeresse apenas o conhecimento da NGB (Nomenclatura Gramatical Brasileira).
Num primeiro momento, houve professores de português que acreditaram que a gramática tivesse sido abolida dos grandes vestibulares. Nada mais falso.
O que ocorreu foi exatamente o contrário.
Foi aí que se deu importante estímulo à mudança do foco das aulas de português.
O vestibular efetivamente passara a aferir o conhecimento da língua, deixando em segundo plano a metalinguagem.Assim, as questões da prova de português passaram a ser baseadas em textos, não mais em frases isoladas. Afere-se agora o grau de conhecimento dos mecanismos de construção do texto, como os elementos de coesão (preposições, conjunções, pronomes) e a ordem adequada dos termos na busca de sentidos unívocos, bem como os recursos figurativos capazes de levar à expressão das sutilezas do pensamento.
É por isso que hoje a prova de redação não se desvincula da prova de gramática.
Em ambas, o que se pretende é basicamente o mesmo.
Na redação, o estudante faz um esforço de síntese dos recursos de que dispõe, pondo-os a serviço das ideias que pretende transmitir; na prova de língua portuguesa, faz a operação inversa, ou seja, o desmonte analítico dos textos escolhidos -que podem ser extraídos de obras literárias, de peças publicitárias, de histórias em quadrinhos, do universo jornalístico, enfim, de quaisquer manifestações da língua.Importa agora que o estudante seja um leitor competente, apto a reconhecer e a manipular as diversas modalidades da língua.
THAÍS NICOLETI DE CAMARGO, consultora de língua portuguesa do Grupo Folha-UOL, é autora dos livros "Redação Linha a Linha" (Publifolha) e "Uso da Vírgula"
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